91293 Knowledge Brief Health, Nutrition and Population Global Practice RESPOSTA AO HIV REDUZINDO A EPIDEMIA DE HIV/AIDS: LIÇÕES DA ARGENTINA Fernando Lavadenz, Carla Pantanali, Eliana Zeballos and Lais Miachon Novembro 2014 MENSAGENS CHAVE: • De 2000 a 2010, Argentina reduziu a carga de morte e de doença causada por HIV/AIDS em 21%, salvando cerca de 4.379 vidas. Esta redução faz do fardo de HIV/AIDS na Argentina o segundo menor da América do Sul depois do Chile. • A Argentina reduziu a transmissão vertical de HIV em 62% entre 2000 e 2011. • Criado em 1995, o Programa Nacional de HIV/AIDS introduziu inovações chave que contribuíram para a redução do fardo de HIV/AIDS na Argentina (Box 1). • Desde 2010 o Programa Nacional de HIV/AIDS é inteiramente financiado domesticamente, e um estudo do Banco Mundial conclui que o programa é custo-benéfico. • Box 1. Inovações programáticas em Onde está a Argentina em HIV/AIDS? HIV/AIDS A Argentina é um país de 41,45 milhões de pessoas (6% I. Introdução precoce de tratamento antirretroviral da população da América Latina e Caribe - ALC), com um (ARV) gratuito desde 1997; PIB de US$14.760 per capita, superando o PIB médio II. Marco jurídico abrangente para os direitos regional de 2013 de US$10,512.1 A Argentina ultrapassa sexuais e reprodutivos; médias regionais em indicadores como média de anos de III. Novo programa de educação sexual nas escolas; escolaridade (9,7 anos, comparado a média regional de IV. Alianças estratégicas entre os programas de 7,9) e expectativa de vida (76 anos, comparado a 74,6).1,2 saúde fundamentais para a redução da O impacto da epidemia de HIV/AIDS foi sentido nos transmissão vertical de mãe para filho; últimos 20 anos, com o número de casos anuais de HIV V. Introdução de incentivos e financiamentos no passando de 1.000 em 1990 a 4.223 em 1997, culminando programa de HIV/AIDS baseada em resultados; em mais de 6.700 novas infecções por ano em 2004.3 VI. Planejamento estratégico utilizando resultados Apesar do crescimento exponencial de novos casos de de pesquisas nacionais da oferta de serviços de HIV, a cobertura financeira de ARVs desde 1997 foi saúde públicos; fundamental em manter o número de casos de AIDS sob VII. Monitoramento eletrônico de materiais e controle (Figura 1). Atualmente, cerca de 110 mil pessoas medicamentos para melhor prestação de contas; vivem com HIV/AIDS no país, com 5.500 novos casos de VIII. Implementação de um sistema de governança HIV a cada ano.3 Em 2010, a carga de HIV/AIDS na clínica eletrônico para melhora na qualidade do Argentina era de 223 anos de vida perdidos ajustados por atendimento e acompanhamento de pacientes. Página 1 HNPGP Knowledge Brief incapacidade (DALY) por 100.000 pessoas, menos da em comparação aos 15% na ALC). 3,7 metade da média regional de 519 DALYs de HIV/AIDS por 100.000 pessoas.4 O que podemos aprender das inovações programáticas na Argentina? Figura 1. Casos e projeções de HIV e AIDS na Argentina, 1990-20153 I. ACESSO UNIVERSAL AO TRATAMENTO PARA 8000 HIV/AIDS É CRUCIAL PARA A PREVENÇÃO Casos de HIV 7000 Casos de AIDS As experiências do Brasil e Argentina mostram que o 6000 acesso universal à ARVs é fundamental para reduzir a 5000 carga de HIV/AIDS. A Argentina alcançou o acesso universal ao tratamento em 2012, com cobertura de 81% 4000 (a OMS define cobertura universal como mais de 80% de 3000 cobertura de ARVs).8 Ambos países fizeram do tratamento 2000 para HIV/AIDS um bem público, provendo acesso gratuito 1000 a todos que necessitam. 0 II. UM MARCO JURÍDICO ABRANGENTE PARA 1990 1995 2000 2005 2010 2015 DIREITOS SEXUAIS E REPRODUTIVOS É ESSENCIAL Em 1995, a Lei 24.455 garantiu o acesso universal aos A Argentina tem 2,9% do total de DALYs regionais de cuidados médicos e tratamento ao HIV/AIDS, incluindo a HIV/AIDS. A Colômbia, com um PIB e população assistência clínica, farmacêutica e psicológica para semelhante, tem 15,7% do total de DALYs por HIV/AIDS pessoas vivendo com HIV/AIDS. Em 1997, o país da região. 4 A Argentina tem a segunda menor carga de introduziu a provisão gratuira de ARVs, independente de HIV/AIDS na América do Sul após o Chile.4 No entanto, renda ou seguro de saúde, garantindo a proteção enquanto a carga de HIV/AIDS no Chile aumentou entre financeira do tratamento de HIV/AIDS para todos. Estes 2000 e 2010, a Argentina reduziu ainda mais a já pequena marcos jurídicos foram essenciais para reduzir tanto o carga por 21,2% - a sétima maior redução na América número de novas infecções por HIV quanto às mortes por Latina durante este período (Figura 2).4 AIDS. O Brazil e a Argentina foram os primeiros países da ALC a Em 2002, a Lei 25.543 determinou a obrigação de garantir o acesso gratuito e universal ao tratamento ARV prestadores e serviços de saúde a oferecer teste de HIV em 1996 e 1997, respectivamente. Apesar do alto custo de para mulheres grávidas. A lei também determinou a ARVs, um estudo do BM mostra que o Programa Nacional cobertura financeira dos testes, e se tornou fundamental Argentino de HIV/AIDS é custo-benéfico, com uma razão para a prevenção da transmissão vertical. Também em de benefício para custo estimada em 1,03.5 De 2001 a 2002, a lei da saúde sexual e da paternidade responsável 2010, a Argentina salvou 4.379 vidas em potencial, (Lei 25.673) estabeleceu o fornecimento de métodos correspondendo a uma média de 23.600 DALYs por ano.5 anticoncepcionais e aconselhamento gratuito para planejamento familiar nos centros de saúde e hospitais O custo do HIV/AIDS na Argentina públicos. Em 2012, o governo Argentino gastou US$285,95 milhões no Programa Nacional de HIV/AIDS. O país atualmente Em 2006, a Lei 26.150 estabeleceu a criação do Programa gasta US$3.178 por DALY de HIV/AIDS – quase três Nacional de Educação Sexual Integral, que faz parte dos vezes a média regional de US$1.052.4,6 O gasto em currículos escolares federais e estaduais em todo o país e HIV/AIDS por DALY da Argentina é o terceiro mais alto da visa ampliar o conhecimento sobre as práticas sexuais região, depois de Cuba e Chile. O país também tem o seguras. segundo gasto por pessoa vivendo com HIV/AIDS da região após Barbados.4,6 Em 2010, a Lei de Igualdade de Casamento (26.618) reconheceu uniões entre pessoas do mesmo sexo. Mais A Argentina aloca 80% do total de despesas com recentemente em 2012, a Lei de Identidade de Gênero HIV/AIDS aos cuidados e tratamento médico, em (26.743) permitiu que transgêneros e transexuais, pessoas comparação com a média da ALC de 75%. Isto se deve que carregam um fardo desproporcional de HIV/AIDS no parcialmente ao maior custo de ARVs na Argentina e país (prevalência de HIV de 34% entre as pessoas trans menor alocação à prevenção (a Argentina designa 1,2% na Argentina), legalmente mudem seu sexo.3 Estas leis dos gastos em HIV/AIDS para atividades de prevenção, criam um quadro legal abrangente que apoia a redução do Página 2 HNPGP Knowledge Brief  estigma que previne o acesso aos serviços de saúde de Figura 3. Novos casos de HIV na Argentina por rota populações diversas e prioritárias. de transmissão, 2001-20023 6000 Figura 2. Mudanças percentuais em DALYs por HIV/AIDS na América Latina, 2000-20104 4000 Mexico -57% Guyana -50% Panama -49% 2000 Peru -43% El Salvador -24% Honduras -23% Argentina -21% 0 Nicaragua -13% 2001-2003 2004-2006 2007-2009 2010-2012 Costa Rica -11% Brasil -5% Heterosexual (homens) Heterosexual (mulheres) Uruguay -1% Homosexual (homens) Transmissão vertical Paraguay 0% Uso de drogas injetáveis Colombia 1% Bolivia 20% Chile 28% V. INCENTIVOS E FINANCIAMENTO COM BASE EM Ecuador 32% RESULTADOS PODEM AUMENTAR A EFETIVIDADE Guatemala 77% DE PROGRAMAS DE HIV/AIDS Venezuela 88% O uso de financiamento com base em resultados pelo Programa Nacional de HIV/AIDS aumentou a III. EDUCAÇÃO SEXUAL EM ESCOLAS MELHORA A responsabilização sistêmica e melhorou o desempenho PREVENÇÃO ENTRE JOVENS em geral.10 Sob o Projeto de Funções Essenciais de Saúde Pública (FESP), um pacote de serviços públicos de saúde Desde a aprovação da Lei 26.150 em 2006, a Argentina garantidos, foi criado com o uso de financiamento com vem implementando um novo programa de educação base em resultados para seis programas de saúde pública: sexual e reprodutiva em todas as escolas públicas. Como doenças imunopreveníveis, doenças transmitidas por resultado, a juventude argentina tem o conhecimento da vetores, tuberculose, doenças não transmissíveis, transmissão do HIV e prevenção mais abrangente da serviços de sangue, e HIV / SIDA. Cada um dos programas região, com 84% dos jovens e 89% das mulheres jovens identificou resultados intermediários como base para (idades 15-24 anos) identificando com precisão os desembolso de recursos. No caso do Programa Nacional métodos de prevenção e equívocos sobre a transmissão de HIV/AIDS, um auditor externo verificou a conclusão de do HIV, seguido pelo Chile com 78% e 85% dos homens e seis indicadores antes de autorizar os pagamentos para as mulheres jovens, respectivamente.9 províncias. O uso de financiamento com base em resultados já foi expandido, e a utilização de resultados IV. ALIANÇAS ESTRATÉGICAS NA PRESTAÇÃO DE intermediários foi consolidada por todo o país. SERVIÇOS PODEM AJUDAR A REDUZIR A TRANSMISSÃO VERTICAL VI. ENQUETES NACIONAIS DE OFERTA DE SERVIÇOS MELHORAM O PLANEJAMENTO A Argentina reduziu sua taxa de transmissão vertical em ESTRATÉGICO 62%, passando de 13,7 por 100.000 nascidos vivos em 2000 para 5,2 em 2011 (Figura 3). Esse sucesso foi A Argentina realizou duas pesquisas nacionais da oferta possível graças a: (i) uma aliança estratégica com o de serviços de saúde (2007 e 2011) nas unidades de programa de sangue seguro, que criou um sistema saúde em todo o país. Agentes subnacionais de abrangente para testes de HIV, DSTs e outras doenças programas de HIV/AIDS também participaram da integrados ao pré-natal; (ii) uma aliança estratégica com o pesquisa. Respostas, tendências, práticas e resultados sistema de vigilância em saúde pública para a criação do foram utilizados para informar o processo nacional de monitoramento epidemiológico da saúde de mulheres planejamento estratégico de HIV/AIDS. Os resultados grávidas soropositivas e análise de dados relacionados. mostram que de 2007-2011, 90% das províncias relataram Contudo, de 2009 a 2010, 47% das mulheres soropositivas uma melhora na oferta e no acesso a serviços de recém-diagnosticadas foram diagnosticados no contexto prevenção, no diagnóstico, e nos cuidados à saúde de da gravidez, ressaltando a necessidade de testes de HIV pessoas vivendo com HIV/AIDS. para mulheres de todas as idades. Página 3 HNPGP Knowledge Brief VII. SISTEMAS DE MONITORAMENTO ONLINE  Problemas de governança na prestação de serviços PODEM REDUZIR DUPLICAÇÕES E AUMENTAR (redes de serviço, recursos humanos, treinamento, EFICIÊNCIA orçamento);  Baixo investimento na prevenção da transmissão do Em 2009, o Ministério da Saúde introduziu um sistema de HIV. monitoramento online que controla o uso e distribuição de suprimentos para HIV/AIDS. O sistema foi projetado com Tenha em mente o apoio do FESP para evitar a perda e duplicação de medicamentos e suprimentos de HIV/AIDS e para  O caso da Argentina mostra que a provisão gratuita de melhorar a eficiência na logística de aquisição, transporte ARVs pode ajudar a reduzir o número de novas e prestação de contas. Atualmente, a implementação do infecções; sistema de monitoramento online foi estendido para a  Inovações contínuas permitem que epidemias metade das províncias do país. controladas de HIV/AIDS sejam reduzidas ainda mais;  Esforços recentes no controle de HIV na Argentina VIII. SISTEMAS DE GOVERNANÇA CLÍNICA ainda não foram completamente avaliados. AUMENTAM A QUALIDADE DA PROVISÃO DE SERVIÇOS DE SAÚDE Referências O Projeto FESP também apoiou o Programa Nacional de 1. World Bank, 2014. World Development Indicators (database). HIV/AIDS no desenvolvimento e implementação de um 2. UNDP, 2014. Human Development Report. sistema de gerenciamento de casos e pacientes. O sistema permite o registro online de pacientes, solicitação 3. Ministry of Health of Argentina, 2013. Boletin N0 30 sobre el VIH- online de autorizações, o monitoramento da carga viral do SIDA y ETS en Argentina. paciente e de outros exames, bem como o monitoramento 4. IHME, Global Burden of Disease (database). de protocolos de tratamento e de ARVs. O software de gerenciamento de casos introduzido em 2011 permite a 5. Lavadenz, F., Pantanali, C., Zeballos, E. Thirty Years of the HIV/AIDS avaliação da qualidade do tratamento, aderência e Epidemic in Argentina: An Assessment of the National Health Response resistência ao tratamento. Todas as províncias estão (Unpublished). ligadas ao sistema, que, até o final de 2012, incluía mais 6. UNAIDS. 2012. Global Report: UNAIDS Report on the Global AIDS de 30.000 pacientes.10 O sistema de monitoramento de Epidemic. Geneva. pacientes com HIV ampliou a eficiência da prescrição e entrega de ART, bem como o acompanhamento de 7. Aran-Matero, D. et al. 2011. Levels of Spending and Resource pacientes. Allocation to HIV Programs and Services in Latin America and the Caribbean. Desafios 8. Pan American Health Organization. 2013. Antiretroviral Treatment in the Spotlight: A Public Health Analysis in Latin America and the Apesar de várias conquistas, a Argentina ainda enfrenta uma série de desafios no combate ao HIV, incluindo: Caribbean. Washington DC.  Sustentabilidade financeira, em longo prazo do 9. _____. 2010. Situation Analysis: Elimination Mother-to-child Programa de AIDS, considerando-se o aumento Transmission of HIV and Congenital Syphilis in the Americas. constante do número de pacientes em tratamento; Washington DC.  Alto custo comparativo de ARVs; 10. World Bank. 2013. Argentina - Essential Public Health Functions and  Persistência de um número elevado de novas Programs Project. Washington, DC; World Bank. infecções entre homens jovens que fazem sexo com homens (HSH), enquanto a maioria dos outros grupos mostram reduções significativas (Figura 3);  Desigualdades geográficas entre províncias nas taxas de HIV/AIDS;  Cobertura insuficiente de testes diagnósticos de HIV As Notas da Prática Global de Saúde, Nutrição e População do Banco Mundial são um guía rápido à informações essenciais em tópicos específicos que resumen novas descobertas e informação. Estas podem ressaltar assuntos e evidências de intervenções comprovadas em saúde, ou disseminar novas descobertas e lições das regiões. Para mais informações neste tópico visite: www.worldbank.org/health. Página 4